domingo, 24 de outubro de 2010

Breve relato de um inativo

Tenho um passageiro que está prestes a se aposentar, depois de mais de 50 anos de trabalho. Ele me confessou que tem dificuldades de se acostumar com a palavra "aposentado". Quando dizem que ele estará aposentado, parece-lhe que o estão condenando à velhice. Pior ainda quando usam o termo "inativo", esse sim um palavrão, como se a pessoa não fosse fazer mais nada na vida.
Em uma madrugada dessas, recebi o telefonema que todos que tem táxi trabalhando à noite temem receber: haviam batido no carro. Somente danos materiais, felizmente.
O táxi está na oficina, e ficará lá por algum tempo. É preciso ter paciência. Acostumado com um ritmo acelerado, subitamente encontro-me em casa sem ter o que fazer. Não é fácil. Depois de alguns dias batendo cabeça, resolvi ocupar meu tempo relatando as angústias e alegrias de um inativo de ocasião.
A primeira coisa que estranhei foi o tamanho dos dias. Quando estou no táxi, parece que as horas voam. Em casa, o dia não tem fim. Já coloquei em dia a leitura atrasada. Devorei uma pilha de livros, que há muito esperavam por um tempo livre. Passada a fase da leitura, estou agora me interessando pela teledramaturgia: Sete Pecados, em Vale a Pena Ver de Novo, está excelente!
Oportunista, minha mulher aproveita a mão de obra ociosa e me coloca a trabalhar. É um tal de colocar prateleiras, mudar vaso de lugar, cortar grama. Minha filha pede que eu escreva sobre determinados assuntos, que, mais tarde, descubro que viraram redações para a escola. Estou perdendo o respeito até da minha cadela, a Pop, que exige que eu a leve toda a hora para passear na praça. Valei-me Deus.
Com uma semana de "inatividade", parece que já estou pegando o jeito da coisa. Hoje, na praça, um idoso perguntou se eu aceitava uma partidinha de dominó. Perdi de dez a zero, mas o tempo passou que eu nem senti. A aposentadoria realmente é uma arte.

8 comentários:

Anônimo disse...

Que bom que foi só danos materiais! E vai que você se acostuma!!!! E nunca mais quer voltar ao taxi, e acaba craque no dominó!!! E o piano?

Magui disse...

Passada a fase de adaptação vai descobrir que está pensado mais, meditando mais e descobrindo coisas que lhe passavam despercebido.Qt ao dominó na praça, papai dizia que o lugar é antecâmara da morte!!!!!!!

Liana disse...

Bah, muito workaholic! hehehe

cRiPpLe_rOoStEr a.k.a. Kamikaze disse...

esse negócio de aposetadoria é complicado mesmo, mas uma coisa que eu sou contra é aposentadoria compulsória aos 70 anos para fucionário público... eu mesmo conheço um ex-funcionário público de 86 anos que só saiu por causa da compulsória, era bastante amigo do meu falecido avô (que foi funcionário público mas se aposentou com 65 anos e uma saúde que já não era mais aquelas coisas), tem uma saúde de ferro e ainda estaria bem se estivesse na ativa...

Vai de Táxi! disse...

DO caralho. A aposentadoria realmente é uma arte.

parabéns. :D

O Neto do Herculano disse...

Saber envelhecer é uma arte,
espero ser um grande artista da vida.

Alexandre RJ disse...

Existem inativos e inativos. Ou "vagabundos" como definiu o nosso querido FHC.

Anônimo disse...

Mauro, já pronta para me besuntar e ir para o sol, resolvi testar a caixa de comentários.
O último que escrevi está aí.

Sobre aposentadoria, eu me acostumei em menos de dois dias. A primeira atitude foi guardar o relógio.Depois arranjei coisinhas para fazer. E essas coisinhas não acabam mais. Tanto que me propus a ficar 3 anos na folga e depois arranjar alguma atividade.Já quase 7 anos depois continuo com os dias cheios, sem precisar voltar a ter trabalho fora de casa.
Bem faz a Gilda: te ajuda a preencher as horas. hahaha!
Em espanhol parar de trabalhar fica mais bonito: jubilado.

De qualquer maneira, vá treinando dominó. O risco é quem passa te chamar de "desocupado".
Beijos.