domingo, 1 de novembro de 2009

Sobre como matei o seu Farina

Seu Farina é um passageiro querido. Certa vez, ligou-me de um cemitério pedindo que eu fosse até lá buscá-lo. No caminho, imaginei uma história fantástica em que o passageiro chama o taxista em um cemitério e, chegando lá, o taxista encontra seu cliente dentro do caixão. Morto!
Escrevi a história. Como seu Farina é um apreciador de literatura, resolvi homenageá-lo usando seu próprio nome, ao invés de usar um nome fictício, como sempre faço. Para aumentar o clima de suspense, minha corrida imaginária se passava à noite. Como não trabalho nesse horário, coloquei ao volante um taxista Bandeira Dois do nosso ponto, meu colega Sassá.
Assim que a história foi publicada no Diário Gaúcho, começou a chover telefonemas para a casa do seu Farina. Todos querendo saber o que tinha acontecido com o simpático velhinho. Meu passageiro, como eu imaginava, levou a coisa toda numa boa. Inclusive, deu-se ao trabalho de me agradecer por escrito.
Seu Farina está vivo, firme e forte, ainda esta semana andou comigo. Sempre que me encontra, pergunta quando vou escrever uma história para ressucitá-lo. Entre risadas, ele diz que adoraria servir novamente de personagem de algum conto meu.
Escrevo tudo isso não só para agradecer a amizade do seu Farina, meu caro passageiro, mas também para homenagear outro personagem daquela história, mesmo que tardiamente. Por uma dessas tristes ironias do destino, quem acabou morrendo de verdade foi meu querido colega, o Sassá. Uma morte repentina e estúpida.
Sassá deixou saudade não só entre seus familiares e colegas de ponto, mas por todo o bairro Menino Deus, já que era um dos mais elegantes e confiáveis taxistas da noite.
Assim como um dia matei o seu Farina, gostaria de poder trazer de volta um colega que se foi. Mas a vida, infelizmente, não é assim tão simples.

8 comentários:

**** disse...

É, caro colega! Matar é tão fácil e ressuscitar, impossível! Esta dor é complicado.
Abraços!

Anônimo disse...

Glória ao seu Farina, que acabou de ressuscitar neste post.

A melhor homenagem a um colega, dita assim em poucas palavras: confiável, elegante, deixou saudade...

Um abraço ensolarado. Por enquanto tem gaúchos e paulistas tirando o mofo aqui na praia.

Gorby disse...

A maior crueldade que a vida tem é não podemos mudar algo que é imutável como a perda de um colega/amigo! A dor fica e o melhor que podemos fazer é lembra-lo sempre dentro de nós pelos melhores motivos!!

Abraço

luka disse...

Seria mesmo muito bom se conseguisse trazer o Sassá de volta, ótimo colega.

Dalva M. Ferreira disse...

Matar, ressucitar, tudo é fácil. O difícil é escrever bem feito você, seu malditinho. Invejinha...

Anunciação disse...

Que Deus coloque o Sassá num bom lugar.Ironia do destino.

Jônatas disse...

Me emocionei ao ler,gostei muito da homenagem. Realmente esse taxista elegante e honesto, faz muita, muita falta. Abraço
Jônatas Fagundes. (Filho do Sassá)

Alexandre RJ disse...

É Mauro, como dizem, "nem sempre a vida imita a literatura"