domingo, 14 de dezembro de 2014

O padre

O padre desembarcou em Porto Alegre um tanto atordoado. Vinha de uma longa viagem, a noite toda sacudindo a bordo de um ônibus fétido. Um pesadelo. Ao deparar-se com o burburinho frenético da estação rodoviária, o santo homem sentiu-se na antessala do inferno. Respirou fundo, pediu proteção divina e dirigiu-se ao ponto de táxi.

Os céus pareciam não estar ajudando aquele servo do Senhor: o táxi que lhe coube parecia o pior de todos, o mais podre. O taxista ao volante era um sujeito grandalhão, bigode espesso e barba por fazer. Ele recebeu o padre sem lhe dirigir o olhar. Ligou o taxímetro e pediu o destino.

O passageiro não sabia ao certo o endereço - tinha perdido o papel na viagem. Mas por certo não seria difícil encontrar. Tratava-se de uma conhecida Casa Franciscana. Em sua cabeça santa, todo taxista deveria conhecer o local. Mas o bigodudo motorista não era muito chegado em religiosidades.

Sem se identificar como padre, o homem passou algumas pistas ao taxista. Já tinha estado na casa, ficava em uma subida, no Centro, perto do Mercado. A noite caía sobre a Capital e o bigode desconfiou que seu passageiro procurava, na verdade, por diversão. Conhecia uma casa na subida da Marechal Floriano. Um inferninho mal frequentado. Não tinha certeza se a dona chamava-se Francisca, mas quem se importa.

Chegando ao local, o padre deu-se conta do engano. O neon vermelho não deixava dúvidas: aquela “casa” não era nada santa. Achou melhor desembarcar do táxi. Procurar pelo endereço a pé. Enquanto fazia o troco, o taxista deu uma dica ao passageiro. Procurasse por Bia, uma anã albina que lhe mostraria o paraíso na terra. A melhor garota da casa, segundo o bigodudo.

Reza a lenda que o padre vagou pelo Centro de Porto Alegre a noite toda sem achar a tal casa cristã. Acabou dormindo na rodoviária à espera de um ônibus que o salvasse daquela cidade devassa. Mas o que ele viu pelas esquinas daquela noite, nenhuma penitência fará esquecer.

3 comentários:

vidacuriosa disse...

Que Deus me perdoe, mas este post é um dos mais interessantes e criaticos "sacrilégios" dos quais tomei conhecimento. rsrsrs

vidacuriosa disse...

ops. Quis escrever criativos e saiu criaticos. Juro que não foi trocadilho intencional.

Mauro Castro disse...

Deus castigou o revisor gramatical, Plínio.