Reprogramando rota

Um novo tipo de passageiro tem aparecido no meu táxi. Ele embarca, senta no banco traseiro e indica o lugar onde quer ir. Em certo ponto do caminho, ele pergunta por que você seguiu reto ao invés de entrar em determinada rua. Você, então, olha para trás e constata que o passageiro está com o GPS do celular ligado.

Não tenho nada contra, desde que me avisem que estou sendo confrontado com um piloto virtual.

A menina embarcou no Bairro Partenon e pediu que eu a levasse até o Shopping Iguatemi. Simpática, ela perguntou se eu me importaria de seguir o caminho que seu celular indicava. Sem problemas, o cliente manda.

Ocorre que o caminho mais curto nem sempre é o melhor.

Sempre olhando para a tela do aparelho, a menina não notou que entramos em uma favela. Ela só percebeu onde estávamos quando o carro que ia à nossa frente pifou. Uma Kombi vendendo produtos de limpeza feitos em fundo de quintal. A roda simplesmente caiu. Trancou tudo. A solução foi desviar por um beco ainda menor.

Com os olhos esbugalhados, a menina encolheu-se no banco traseiro. Sugeri que ela guardasse seu enorme celular na bolsa. Descendo por uma viela esburacada, os retrovisores do táxi quase raspando nas portas dos barracos, o cenário não era dos mais agradáveis. Um velho tomando café apareceu na janela de um casebre, parecia surpreso com o súbito movimento de carros no seu beco. Caixas de som colocadas em outra janela mandavam um batidão. Funk ostentação.

De repente, a garota de apartamento assistia pela janela do meu táxi o que ela só conhecia pela televisão. A pobreza. Se colocasse o braço para fora, poderia pegar o carrapato do tamanho de uma bola de gude que sugava o lombo de um cachorro vira-lata. Realidade aumentada, 3D com cheiro e gostinho de não-quero-mais.

Quando, por fim, voltamos à superfície asfaltada, a garota deixou o GPS pra lá. Abriu o aplicativo de mensagens. Tinha muitas novidades para contar às amiguxas do Face!