domingo, 19 de janeiro de 2014

Breve relato de uma longa noite

O taxista não tinha muitas perspectivas. O serviço estava fraco naquele anoitecer de verão. Tudo levava a crer que seria mais uma noite de vacas magras.

Mas uma passageira apareceu. Mal vestida e parecendo assustada. Carregava duas grandes bolsas de viagem. Perguntou quanto o taxista cobraria para levá-la à cidade de Pelotas. Disse que pagaria em dinheiro. Em dólares. Para provar que estava falando sério, puxou um punhado de verdinhas da bolsa.

Seria arriscado largar para um lugar distante, a uma hora daquelas, com uma passageira com cara de doida pagando em moeda estrangeira. O taxista, então, estipulou um preço alto, para não fazer a corrida. Oitocentos dólares. A mulher puxou quatro notas de cem e entregou ao motorista. Metade adiantado. Vamos nessa.

O táxi rasgou a noite do Rio Grande em alta velocidade. Três horas e tanto de viajem. Direto para o cemitério de Pelotas onde a mãe da passageira se velava. Na capela mortuária, poucos familiares. Depois de choros e abraços, as mulheres providenciaram um café para o taxista, que precisava voltar para Porto Alegre.

O dinheiro da corrida foi colocado no bolso do motorista enquanto ele se alimentava. Um último gole de café e bateu arranque. Precisava entregar o táxi para o patrão antes do amanhecer.

Os primeiros raios de sol iluminavam a Capital quando o taxista cruzou a Ponte do Guaíba. Entrou na garagem no horário. Só quando desligou o táxi é que se lembrou de contar o dinheiro que haviam colocado em seu bolso. Oitocentos dólares. Em meio à confusão, não descontaram os quatrocentos do adiantamento!

Nos dias que se seguiram, um boato se espalhou pelas redondezas do ponto de táxi. Falava-se de uma empregada doméstica que teria fugido com os dólares do patrão, um conhecido político local. Ao que tudo indica, dinheiro de origem duvidosa, a ponto de não envolverem a polícia no caso.

O taxista sonha com outras noites como aquela.

3 comentários:

ricardo garopaba blauth disse...

dinheiro a estas alturas mais que "lavado"...........

Inaie disse...

nem o patrao deu queixa, nem ela voltou para pegar os 400 de volta...kkk

Marcelo Carnelos disse...

Ladrão que rouba ladrão.....também tem medo de aparecer!!