domingo, 13 de março de 2011

Dedo no gatilho

Quando encostou o cano do revólver embaixo do queixo, o dedo ainda não estava no gatilho, havia tempo para voltar atrás, mas não faria sentido mudar de ideia. Depois de tanto tempo matutando aquele plano, o homem já tinha a coisa como certa: daria fim à sua vida, ali, no banco traseiro daquele táxi, que havia acabado de estacionar em frente ao salão de beleza. O taxista que o desculpasse.
Marlene, a namorada do passageiro, que trabalhava como massoterapeuta no salão, haveria de ficar sabendo assim que ouvisse a gritaria. O taxista sairia correndo, apavorado, a polícia seria chamada, os funcionários do salão seriam os primeiros a chegar ao táxi, querendo ver o homem que acabara de enfiar uma bala na cabeça.
Com sorte, o disparo não o deixaria desfigurado, Marlene seria a primeira a reconhecer o suicida. Entraria em pânico, teria que ser amparada, sem dúvida - ela sempre foi fiasquenta. Em seu desespero, a culpa pela morte do namorado lhe invadiria a mente. Lembraria das ameaças do namorado, que dizia preferir a morte a viver sem ela. Lamentaria o fato de não tê-lo levado a sério. Teria de conviver para sempre com o remorso, enquanto ele deixaria sua vida medíocre de forma espetacular. Essa era a ideia.
O taxista não notou o passageiro levando o revólver ao queixo. Era agora a hora certa.
O homem começava a pressionar o dedo no gatilho quando seu telefone tocou! Depois de um momento de dúvida, resolveu atender.
Do outro lado da linha, uma voz simpática avisava que aquela ligação seria gravada e que ele estava sendo escolhido entre muitos clientes do banco para estar recebendo um cartão de crédito internacional, um novo limite no cheque especial, isenções nas tarifas, além de estar ganhando uma linda cadeira de praia com o logotipo do banco.
Além da tendência suicida, outro grave problema daquele homem era a incapacidade de resistir a uma boa oferta. Bateu no ombro do taxista e pediu que o levasse à agência mais próxima do tal banco.

12 comentários:

Cacerenga disse...

Humor dos bons, meu chapa. E é aquela, entre uma boa oferta de última hora e um suicídio planejado, putz, a morte pode esperar um pouco...

Eliana disse...

Hahaha Muito bom!

Cartões de crédito também salvam vidas... Hahaha

Tempos sem passar por aqui... tenho muita leitura pra por em dia!

Bom domingo!

Abraços!

Bete Nunes disse...

E ainda falam mal de banqueiro...


Adorei os gerundismos!...

Anônimo disse...

Olá!
É, acho que sim, também estou por lá.
Te acompanho agora!
Um bom final de semana!

Dona Sra. Urtigão disse...

Ótimo texto. E não é que é até possível...

Thai Nascimento disse...

Nesse caso, bom pra ele, porque se ele tivesse de fato se suicidado, provavelmente não seria "vingado" pelo remorso da namorada - não por muito tempo. Sempre superamos essas coisas, cedo ou tarde.

Texto massa, muito massa.

byTONHO disse...



Além do SAMU e ECOsalva
o TELEmarketing também SALVA!

:)

vidacuriosa disse...

Viu. E ainda falam mal do telemarketing?
E eu que pensei que na outra linha estava a sogra com mais uma reclamação ou a própria mulher, dizendo que comprou mais um produto de "alta" necessidade. Aí o final certamente seria outro.
Abrs.

Ricardo Mainieri disse...

Boa estória, Mauro. Uma das melhores que li por aqui. Um tanto de Hitcock, outro de Rubem Fonseca.
O final feliz, quando tudo parecia desabar.
Parabéns.

Ricardo Mainieri

Clarice disse...

Agora ele "vai estar fazendo" dívidas mortais.
Ironia da fina, vizinho! Em outros tempos pré-computador eu diria que você afiou a ponta do lápis pra escrever.
Abraço.

Leci Irene disse...

KKKKKK! Vida salva por um cartão de crédito!

Ludimila Bassan disse...

O que cartão de crédito à prova de balas??
essa é nova para mim...
adorei o seu blog, o encontrei por indicação do blogger:D estou seguindo
beijos e uma ótima semana