domingo, 4 de julho de 2010

Cada táxi uma história

Dia desses, um colega parou seu táxi ao lado do meu, na sinaleira. No intervalo de um sinal vermelho, ele me contou que havia trabalhado no prefixo que agora é meu; que isso já fazia mais de trinta anos, mas que nunca esqueceria aquela época, pois, segundo ele, tinha sido a melhor fase de sua vida. Contou que agora é dono do táxi em que trabalha - um modelo de luxo -, muito diferente do tempo em que trabalhou no meu prefixo, quando era apenas um jovem começando a vida, recebendo à base de comissão. Apesar disso, disse que sentia saudades.
O sinal abriu, meu colega despediu-se e se foi com seu ar nostálgico avenida afora. O episódio me deixou pensativo. Assim como meu saudoso colega, também vivi bons e maus momentos ao longo dos vinte e tantos anos que trabalho no meu táxi. Assim como ele, também estou construindo minha vida graças e esse pequeno veículo de praça, que roda dia após dia pelas ruas da cidade. Acredito que cada taxista tem lá a sua história para contar.
Meu colega Osvaldo Xiru, por exemplo, contou que herdou o táxi de seu pai em uma situação curiosa. O pai do Xiru era viciado em corridas de cavalo. Era proprietário de uma égua que era famosa em corridas de cancha reta. Um dia, o velho teria feito uma aposta alta, contra um cavalo de um criador uruguaio. Não tendo como cobrir o valor apostado, ele teria dado o táxi como garantia. A égua teria perdido a disputa por um pescoço.
No dia seguinte, o dono do cavalo vencedor, vendo que o táxi sustentava uma família, resolveu não cobrar seu prêmio, mas obrigou o taxista a colocar o táxi no nome do filho, para que não arriscasse mais perdê-lo. Um belo gesto, que acabou garantindo o futuro do Osvaldo Xiru, que hoje ganha a vida na praça, no táxi que seu pai quase botou fora.
Porto Alegre tem em torno de quatro mil táxis. Atrás destes tantos volantes, muitas histórias.

** Semana passada, contei que meu colega Suquinho teria sugerido a uma passageira disputar o troco da corrida no par ou impar. A história realmente aconteceu, mas, a bem da verdade, Suquinho lembrou-me que a ideia partiu da passageira, não dele. Que seja.

8 comentários:

Eliana disse...

Me recordo dessa história da herança... você já contou ela numa outra circunstância ou estou enganada?

Mesmo assim , é sempre bom recordar boas histórias!

Imagino quantas boas histórias estão ocultas entre volantes de táxis por esse Brasil afora...

Basta encontrar bons contadores de histórias... Este sim, é um talento ímpar! O qual você tem de sobra!

Parabéns Mauro! Adoro ler tuas histórias!

Abraços!

Liana disse...

Depois que comecei a ler as tuas histórias, sempre fico imaginando as histórias que os taxistas teriam pra contar quando pego um táxi, mas na maioria das vezes, acabo nem conversando com eles, fico distraída nos meus pensamentos e quando vejo, já cheguei ao meu destino.

Liana disse...

PS: um dia desses peguei táxi com um taxista que é poeta, ele estava pra lançar o segundo livro de poesias. Como eu tenho uma péssima memória, esqueci o nome dele e do livro. =S

Anônimo disse...

Meu pai, por algum tempo, foi exímio jogador de cartas(canastra, pôker). Pouco tinha para apostar. Parece que sempre levava um troquinho para completar o salário. Até que desistiu de vez, quando viu um apostador colocar a aliança sobre a mesa de apostas.
Até hoje não sei se a mesa encarou aquilo como desespero ou se ficaram com receio de ter de levar a dona da aliança como troco.
Atrás de cada volante e janelas histórias para rodas de chimarrão.
Diga para o Suquinho que a ordem dos tratores não altera o produto. Onde já se viu disputar moedinha?
Abraço.

John disse...

Football, what a pity!
Thanks for the greeting, every time I get someone in the taxi from Brazil I tell them to look up your blog.All those beautiful girls who come here from your country!
Have a great day.
John

**** disse...

Vou colar de Faulkner, as histórias que você relata são mais importantes que o mais importante jornalismo. Abraços!

Sylvio de Alencar. disse...

Tem dias que, como o Suquinho, brincamos com a gente mesmo.

Dalva M. Ferreira disse...

Esses encontros na sinaleira...