sábado, 24 de fevereiro de 2018

Só depois que já estava sentado ao meu lado, porta do táxi fechada, percebi o estado do meu cliente: duro na cachaça.
Com voz pastosa, o bebum ordenou que eu o lavasse até o "bar do Zé". Irritou-se quando eu perguntei aonde ficava tal estabelecimento - na cabeça embriagada dele, todos deveriam conhecer o local. Após alguns segundos contemplando o infinito, ele forneceu uma pista: Azenha. Vambora.
Alguma coisa havia acontecido no bar do Zé. O lugar estava cercado por curiosos, duas viaturas da polícia sobre a calçada e o que parecia ser o corpo de um homem estirado no chão, coberto por uma toalha de mesa.
- Bah, assaltaram o Zé de novo, taxista.
- Acho que foi mais do que um assalto...
- Será que tá funcionando? Preciso só mais um gole, vou ver se o Zé me atende. Pode deixar o taxímetro ligado.
Meu cliente entrou cambaleando pelo meio dos policiais, afastando a fita de isolamento, quase tropeçando no morto. Bateu boca. Não demorou a ser expulso da cena do crime. Voltou para o táxi indignado, de bico seco.
- Ué, o Zé não pode te atender?
- Não.
- O que ele disse?
- Nada. Tá lá, deitado no chão.
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Convencido pela mulher, meu colega Paulinho contou que acabou aceitando o convite do cunhado dele, "um chato", para passarem um dia na praia. Paulinho disse que não gosta de praia, detesta o cunhado, mas acabou cedendo à pressão da esposa, em nome da paz conjugal. Os dois casais, um dia apenas, o cunhado ajudaria no combustível... Bora.
Todos dentro do táxi, tudo pronto, cinto de segurança, solta o freio de mão, Paulinho engata a primeira marcha, o cunhado resolve puxar um assunto, pra quebrar o gelo:
- Então, Paulinho, como está a situação com o Uber?
Desengata a marcha, puxa o freio de mão, solta o cinto, todo mundo pra fora, acabou o passeio.
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pedido de ajuda
No meio da noite, o táxi resolveu pifar, desligou, do nada, dessas panes inexplicáveis que os carros por vezes apresentam. Eu tinha largado um passageiro lá pras bandas de Itapuã e tentava voltar à civilização por uma estradinha de terra perdida na labiríntica zona rural de Porto Alegre. Entre o nada e lugar nenhum, o táxi morreu. Na mais completa escuridão, sem GPS, sem sinal de celular para pedir ajuda, nem sequer uma lanterna, o jeito foi sair em busca de socorro.
Bati em uma espécie de sítio, chácara, sei lá, havia luz na casa e resolvi entrar. Na porta, atendeu-me uma mulher vestida com uma roupa estranha, tipo uma camisola semitransparente. Ela era muito clara, quase albina, olhos amarelados e usava uma tiara de flores no cabelo. Convidou-me a entrar. Licença.
Outras mulheres do mesmo tipo apareceram na sala, um ambiente amplo porém lúgubre, sinistro, mal iluminado por lâmpadas âmbares e vermelhas, tudo muito estranho. Enquanto me providenciavam um telefone, serviram-me uma bebida, que, por educação, aceitei. Não tardou a sentir-me tonto. O que se passou a seguir, não posso precisar, dar certeza, pois não era mais senhor de minhas faculdades mentais. Restaram apenas flashes, partes nebulosas de lembranças que me permitem concluir o seguinte: funciona na tal chácara uma espécie de seita de ninfomaníacas.
As mulheres se aproveitaram de mim, usaram meu corpo, sugaram-me as forças, inflaram meu libido ao extremo, num tipo de ritual coletivo de possessão sexual no qual defloraram minha intimidade ao som de cantos gregorianos em alto volume. Satisfiz uma a uma, com uma virilidade animalesca que nem eu mesmo supunha possuir. Uma loucura!
Amanheci completamente nú, dentro do meu táxi, que, por milagre, voltou a funcionar. Quando alcancei o sinal de celular, milhares de mensagens, SMSs, whats, ligações perdidas: minha mulher tentando me localizar.
O que peço aos amigos desta rede social é muito simples: Solidariedade. Preciso de depoimentos de outros homens que também tenham sido vítimas de tais mulheres, que conheçam o sítio, a Seita das Ninfomaníacas, alguém por certo pode testemunhar a meu favor, convencer minha mulher de que falo a verdade. Porque vou dizer: tá duro dormir no sofá.
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Projetando o corpo entre os bancos do táxi, a passageira pede a gentileza:
- Acabo de sair da manicure, o senhor se importa de pegar o dinheiro pra mim?
- Ããã...
- Aqui, no seio direito, por favor.
- Dá licença.
- Direito, seio direito.
- Ops, me atrapalhei, ãã pronto, ufa. Belo soutien.
- Brigada.
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AVISO
este post contém cenas fortes
O problema não era o fato de o homem ter a língua presa e falar sem parar, comendo os erres, nem o assunto enfadonho da intervenção no Rio, falando, falando, exército, Temer, Rio, segurança, o problema não era nem o mau hálito, nem o nariz enorme, bolotudo, vermelho e cheio de microvarizes, típico dos alcoólatras, nem os pelos compridos que saiam por aquele nariz avantajado, não, até aí tudo bem, taxistas estão acostumados a tudo, o problema não era nada disso.
O problema é que, grudado na ponta de um daqueles pelos que extrapolaram a cavidade nasal do passageiro, pendurado, balançando à medida que o homem falava, havia uma casquinha, como direi, um naco de mucosa nasal ressequida, uma bolota de ranho, na verdade, pendurada no nariz do meu cliente. Se é que me entendem.
Como lidar com isso?
Meu olhar era atraído por aquele "sedimento" oscilante, era tudo o que eu via, como o pêndulo do hipnotizador, meu olho acompanhando, e o homem falando, falando sem parar, traficantes, exército, Temer, Rio (tente pronunciar met'alhado'a sem os erres) e eu só olhando para a "coisa" pendurada, na dúvida se avisava ou não, um estranho, talvez fosse nervoso, melhor não falar, eu simulando limpar meu próprio nariz, na esperança que meu passageiro percebesse o "problema", mas que nada, só exército, só intervenção, só o Rio, quem quer saber do rio?, pelo amor de Deus!, esse negócio pendurado no narigão, tira isso daí!, mas não falei, o homem exaltado, discursando, a "coisa" ameaçando se desprender, eu torcendo, que agonia!
Tem um projeto na Câmara pleiteando aposentadoria especial para taxistas, alegando trabalho em ambiente insalubre. Deveria tramitar em regime de urgência urgentíssima.
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Tiozão saindo de um hotel, indo pra rodoviária puto da cara. Veio à Capital para o jogo do Grêmio. Resolveu comemorar o título com um grupo de torcedores numa famosa casa de prostituição. Não lembra de ter comido ninguém, mas, ao conferir o comprovante do cartão, agora pela manhã: R$1.200!
- Não se levanta uma taça todos os dias...
- O problema não é esse, taxista. Acontece que, na loucura, usei o cartão de uma conta conjunta. Minha mulher já deve ter recebido mensagem com a despesa.
- Ai, ai, ai.

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